Felício era um pintor de primeira, não apenas um pedreiro com “nome bonito”, mas entendia da coisa de verdade. Dominava técnicas de pintura e mistura de tintas, diferentes acabamentos e fazia milagres com as cagadas que seus colegas de obra deixavam para a fase de entrega do imóvel.

Era minimamente estudado e muitos perguntavam porque não fazia uma universidade, ou ia “buscar algo melhor”. A resposta era sempre um franzido de testa – dizia que estava bem como pintor, e que não queria ser só mais um formado implorando emprego por aí. Com a economia aquecida, não faltava serviço para Felício e o homem tirava uma bela grana. Organizado, limpo e competente – todo empreiteiro queria um funcionário assim.

Um dia, passando pelo boteco do Calixto, a duas quadras de seu humilde sobrado no Cangaíba, viu uma menina de saia, que discutia com um dos pinguços locais. Não teve dúvida: entrou gritando, meteu a mão no peito do bêbado e empurrou, enxotando o pudim de pinga. Perguntou à menina se queria companhia até em casa, e ela anuiu. Marina também morava a poucas quadras dali.

Quase todo dia os dois se visitavam. Marina ajudava uma costureira do bairro e, invariavelmente, estava pelas redondezas. Felício começou a acelerar o serviço para ter com a menina mais cedo todos os dias e acompanhá-la até em casa.

Os anos se passaram. Pegação, namoro, caso, noivado… até que um dia Felício tomou coragem, pediu a mão da menina e marcaram data para o casório. Faltando seis meses para a cerimônia, os dois já moravam juntos, e Marina começou a ter irritações e brotoejas por todo o corpo. “É a tinta… alergia”, diagnosticou a costureira com quem a garota trabalhava.

Felício, que já era limpo, passou a ser neurótico. Saía da obra e lavava o corpo com tinner até tirar a última molécula de tinta do corpo. Sempre sobrava um pouco, e Marina tornava a pipocar. Alguns meses se passaram, médicos, conselhos, mas ninguém achava jeito de parar a alergia.

Acabaram se separando, os dois. Em meio a muito choro e tristeza, chegaram juntos à conclusão de que não daria certo. Cada um seguiu para seu canto e o tempo passou.

Dois anos depois, Felício soube que Marina havia casado – com um pintor. O rapaz quase se matou, mas a curiosidade era maior que a depressão, e resolveu investigar. Foi ter com a costureira, que já não empregava mais Marina.

A costureira contou que Marina conhecera Adriano – às vezes pedreiro, às vezes pintor, um desses “faz-tudo”. Na verdade não tinha a mão muito boa, era relaxado e só conseguia serviço por intermédio de colegas e gatos de obra. Chegava todos os dias sujo de tinta, cal, cimento e o que mais houvesse na obra.

Felício falou à costureira a respeito da alergia, aliás, diagnosticada por ela. A velhota riu-se e limitou-se a sentenciar: “que alergia a tinta que nada – era o tinner. Aprende isso, meu filho, mulher gosta mesmo é de homem sujo”. Marina ainda mora no bairro. Quando se aproxima do boteco do Calixto, a rapaziada faz as apostas: de que cor a menina vai vir suja hoje?

A profissão de médico ainda atrai muitos. Seara dos cheiros, imagens e texturas desagradáveis, o corpo humano ainda assim parece oferecer um atrativo para muitos daqueles que buscam respostas em sua graduação. Numa dessas levas, um estudante se destacou mais do que todos os demais – sua sorte, contudo, não foi das melhores e ele acabou como chefe de diagnósticos no PS da Vila Nhocuné, Zona Leste de São Paulo.

Ernesto Vidigal Souza, conhecido pelos colegas como “Ráuze”, é desde o início de sua carreira conhecido pelos controversos diagnósticos e tratamentos que leva a cabo.

Era um sábado como outro qualquer no PS e Ráuze procurava algo para fazer. Com a maioria das enfermeiras novinhas de folga, somente sobrara a visão de duas matronas, técnicas de enfermagem de carreira, tão feias quanto os cortes e hematomas com os quais lidavam diariamente.

Repentinamente, um vulto irrompeu vindo do atendimento e entrou na área do ambulatório, mancando como se tivesse uma perna de pau e com a testa franzida. O rapaz não queria conversas com enfermeiros ou assistentes, queria um médico, e queria agora. Do lado oposto do corredor, Ráuze fez aquela cara enigmática que havia lhe garantido o apelido. Iria ele mesmo atender ao inesperado paciente.

O rapaz, de 1,90m e provavelmente mais de 100 kg, fazia o ambulatório parecer um lavabo. Ráuze se encolheu por detrás dos suportes de soro para poder examinar o corpulento paciente. O camarada não perdeu tempo: sentou-se na primeira maca que pôde, arrancou o tênis tamanho 43 e jogou de canto. “Olha, doutor, o tamanho dessa bolha”, exclamou.

Ráuze poucas vezes vira bolas de gude daquele tamanho. Sem dúvida era uma bolha proporcional para o tamanho do pé do sujeito. Na parte exterior do dedão, a bolha era quase um sexto dedo. Ráuze resolver drenar a bichinha – trabalho que durou dez minutos – e após isso lavou e fez um curativo, dispensando o paciente.

Duas semanas depois, o jagunço torna a aparecer, com uma bolha ainda maior que a primeira. Repetindo todo o procedimento, Ráuze tornou a liberar o paciente. As visitas periódicas do sujeito ocorreram mais duas ou três vezes. Até que um belo dia, novamente num sábado, o camarada aparece no PS. Na recepção, dizem que o doutor Ráuze não pode atendê-lo, mas que deixou um bilhete com um recado e um receituário: “Prezado Fulano, no show da próxima sexta-feira, quando for calçar o salto, favor se lembrar que vaselina também serve para usar nos pés”.

Tiago tinha certeza de que era genial. Colocava todas as suas “brilhantes” idéias como “sugestões”, principalmente para seus subalternos, e ai daquele que achasse uma merda – era imediatamente colocado de lado com aqueles argumentos infantis que só os chefes de segunda sabem dar, como a história do “faço isso faz tantos anos” ou “no último evento que fiz isso deu certo”. Em outras palavras, um daqueles caras que se utilizava de referências que ninguém conhece para dar ordens que ninguém aprova.

Se apegava a detalhes com pouca relevância como estratégia para não botar a mão na massa, enquanto seus lacaios se apinhavam de trabalho para receber um elogio magro no final de tudo, seguido de uma crítica “construtiva”.

Num desses episódios de despotismo, conheceu Ana Carolina. Como uma criança que ganha um brinquedo novo, pareceu esquecer imediatamente de que era casado com filhos e resolveu partir para cima. Enquanto seus funcionários davam o típico duro para resolver, decidir, carregar, montar, desmontar e enviar as coisas com as quais ele não se preocupava ou simplesmente esquecia, Tiago bolava estratégias infalíveis para subjugar sua nova vítima.

Enquanto todos desmontavam e organizavam o final do evento que acabara de ocorrer, Tiago já solicitava táxis e falava em pagar uma rodada para todos que haviam trabalhado. Como esperava, no entanto, metade da equipe, cansada e esgotada por fazer não apenas o trabalho deles, mas também o de Tiago, desistiu da empreitada, e assim o rapaz conseguiu reduzir grande parte dos obstáculos para realização de seu intento.

Não foi difícil. Ana Carolina já estava meio no papo e não parecia muito inteligente – não tardou mais que cinco minutos para que Tiago abatesse a vítima. A caminhada rumo aos três pontos foi uma estrada de tijolos amarelos e, no dia seguinte, o rapaz pegou o vôo de volta para a matriz da empresa. “Vini, vidi, vici” e um sono com um sorriso na boca.

Contudo, a história se tornou frequente, e Tiago, já de saco cheio de sua esposa bem sucedida, começou a se afeiçoar a Ana Carolina. Como um adolescente, passava horas ao telefone e por vezes era possível até mesmo pegá-lo desenhando com os pés enquanto conversava com sua recém-descoberta paixão. De diretor passou a colegial deslumbrada em menos de uma semana.

Enquanto isso, Tiago seguia cada vez mais delegando. Sem tempo para suas “tradicionais” funções de diretor, passava a bola em quase tudo, desde decidir até limpar a bunda. Quando todos se pensavam livres dele, no entanto, reaparecia, ávido por saber como as coisas estavam, uma vez que não havia até ali acompanhado porra nenhuma. Com sua mulher, a rotina não era muito diferente: toda vez que ela pensava estar se acostumando a tocar as coisas sozinhas, o fidalgo reaparecia exigindo relatório completo de tempos e movimentos.

Ana Carolina não tardou muito a perceber o grau de inocência de seu novo parceiro. Criada pela família para ser uma moça “para casar”, logo começou pressões e sugestões a respeito do futuro e Tiago, como todo homem casado, passou a contar com a distância e com o caráter esporádico de sua relação para evitar uma tomada de decisão.

Aparentemente feliz e satisfeito com o melhor de dois mundos, Tiago não fez caso e continuou a estender a coisa, incerta mesmo do jeito que estava. Como um marinheiro, sustentava dois portos com presentinhos comprados em liquidações do duty-free e clichês de dias dos namorados.

Um ano se passou e Tiago foi promovido. Seu novo cargo tornava viagens ainda mais frequentes e com o tempo, o ato de “tirar o atraso” não fazia sequer mais sentido – uma vez que o atraso era tirado antes mesmo de atrasar. Com toda uma nova legião de lacaios, Tiago se surpreendeu e se alegrou com o fato de poder trabalhar ainda menos do que antes e mandar ver ainda mais.

Como uma Cinderela de barbas, achou que seu sonho duraria para sempre, até que o dia em que Ana Carolina avisou aos colegas que estava deixando a empresa. A menina, com um plano cuja justificativa profissional e pessoal pareceria estranha a um hamster em coma, decidira deixar a empresa para fazer um curso e viver no exterior – na cidade onde Tiago vivia apenas por uma daquelas coincidências de filmes da Sessão da Tarde.

Aparentemente ciente e feliz, Tiago na verdade começara a desmoronar por dentro. Sonhava com notinhas de 100 dólares se suicidando em um penhasco e com a mulher e a amante saindo juntas para fazer compras no shopping, enquanto ele cuidava das tarefas domésticas e dos filhos de ambas. Algo precisava ser feito imediatamente – mas como decidir o que ser feito após uma vida inteira sem decidir merda nenhuma.

Tiago aquiesceu e Ana fez todos os preparativos. Seis meses depois e três mil dólares por mês mais pobres, Tiago e Ana casaram-se. A desculpa dos estudos e da falta de oportunidades num país estrangeiro levaram Tiago a implorar por mais funções na empresa, de forma a garantir os trocados a mais que pudessem manter os presentinhos para a nova esposa – agora não mais escolhidos em liquidações e queimas de estoque.

Em um fim de semana, enquanto lavava a louça e cuidava de seu novo rebento, de avental, pensou pela primeira vez nos funcionários a quem delegava funções. Entendeu o desejo de liberdade e o instinto sanguinário que seus lacaios sentiam e, num acesso de fúria, arrancou avental e roupas e saiu correndo nu, pelas ruas, gritando “liberdade”.

Ana Carolina pegou uma pensão gorda e voltou a viver com seus pais – o certificado do curso no exterior ainda está no fundo da gaveta de meias e calcinhas. Enquanto isso, em uma casa de repouso nos confins da zona rural, um paciente quase sempre nu pede aos loucos e idosos relatórios sobre suas realizações diárias.

Dois amigos caminhavam por entre os escuros becos do Belenzinho, por volta da uma da manhã. Já iam meio sonolentos e cansados – o ‘happy-hour’ durou um pouco mais do que devia e tiveram de pegar um ônibus, ao invés do metrô. Mais umas quadras e chegariam ao apê onde moravam, numa daquelas famosas vilas conhecidas como antros de italianos, mas que hoje de italianas só tinham alguma macarronada meia boca feita de fim de semana.

Em certo momento, após muito caminhar, tiveram a impressão de que andavam mais do que supostamente deveriam. O rapaz da esquerda parou de repente, dando-se conta de que já iam perdidos os dois. olhou no relógio e já passava das duas.

Pararam e olharam em volta… nada lhes parecia familiar, no entanto. o segundo rapaz acendeu um cigarro, comentando que deveriam voltar para o lado do ponto de ônibus, pois dali saberiam refazer o caminho, dessa vez o correto. Por mais meia hora caminharam, e nada.

Embriagados estavam, mas nada de absurdo. Não era possível que não pudessem encontrar o caminho de volta. Andaram um pouco mais e depararam com um boteco, ainda aberto. O balconista deu “noite”, mas não soube dizer em que direção ficava o endereço que os rapazes procuravam. Ofereceu-se então para servir uma cerveja aos dois – “a primeira por conta da casa”, disse ele.

Aceitaram, decidindo esperar até o dia raiar para que pudessem assim localizar sua casa mais facilmente. Quatro da manhã, com os dois já breacos, e o balconista seguia servindo “por conta da casa”. Quando deu cinco da matina, os dois já nem enxergavam direito – deu mais quinze minutos e o primeiro caiu, sendo logo seguido pelo companheiro.

Seis da manhã, os dois acordam, ainda bêbados, e um bilhete grudado no peito de um deles. O papel trazia um mapa, com a localização da rua que procuravam e um simpático “quando quiser, de novo por conta da casa”. O bar, em frente, estava com as portas baixadas. Caminharam aliviados e bêbados até em casa, com a mente livre e descontraída, e um pequeno desconforto na parte de trás.

Moral da História: por mais mistério que possa haver, cu de bêbado continua sem ter dono.

Downsizing. s.m. – as empresas, especialmente nesses tempos de crise, anunciam a torto e a direito programas de “downsizing”. 1. Modo de dizer que “a empresa está na merda” de um modo pomposo e eufemista 2. Excelente desculpa para botar você na rua, provavelmente “descontinuando” seu departamento 3. Uma maneira de referir-se às consequências diversas das cagadas efetuadas pela diretoria da empresa, bem como ao modo de resolvê-las.

Josias abriu cuidadosamente a porta da cozinha. Assim que escancarou a porta-camarão que separava o cômodo da ampla sala de jantar sentiu um vento gelado nas canelas e chegou até mesmo a ouvir um zunido. A cozinha parecia ter sido levada por uma quadrilha daquelas que assaltam caminhões das Casas Bahia. Sem fogão, sem armários, sem nenhum mobiliário, sem mesa, sem gaveteiros, sem panelas e até mesmo sem cortinas. Apenas, como se fora um monolito medieval, a tal geladeira em inox de porta dupla – e claro, com seu dispenser especial para água e gelo.

A esposa, Fátima, vinha enchendo o saco para que ele comprasse a tal geladeira desde que começaram a organizar a mudança. De nada adiantava Josias argumentar a respeito do orçamento, que era curto e tudo mais. Fátima tinha certeza que na base das prestações “dava pra segurar”. Dava o cacete, mas o fato é que Josias, além de meio pau-mandado, tinha pouca paciência. Um dia ficou puto, botou todos os móveis e utensílios da cozinha no prego e deu entrada na merda da geladeira.

Como mulher satisfeita só existe em filme, assim que chegaram na casa nova, com a cozinha virando o “quarto de bebê da geladeira”, Fátima desatou a reclamar. Precisava de fogão, armário, gaveteiro e a puta que pariu. De novo, a história do orçamento não funcionou e dá-lhe Josias nas Casas André Luiz, procurar de segunda-mão o que havia botado no prego de primeira.

Gastou uns 500 contos, mas conseguiu quase tudo o que queria. Descolou um carreto, enfiou tudo na caçamba e foi para casa descarregar. Como além de pau-mandado e sem paciência Josias também não tinha muitos neurônios, resolveu amarrar as tralhas com um cabo de aço.

Chegando em casa, começaram ele e o cara do carreto a descer tudo. Quando chegou no fogão, que ia amarrado com o cabo de aço, o sujeito do carreto deixou escorregar e cair no chão. O problema seria só o fogão, se o idiota do Josias não estivesse com o cabo atado ao pulso. O peso do fogão desabando fez o cabo correr em seu pulso, e o sangue jorrou para todo lado.

O coitado foi para o Hospital das Clínicas, onde teve de amputar a mão direita. Ficou só o toquinho. Chegou em casa no dia seguinte, todo fodido, sem dormir, com a mão amputada e uma sede do cacete. Foi para a cozinha, pegou um copo e foi em direção à geladeira. Pôs o copo em cima da pia e abriu a porta – praguejou quando viu que não conseguiria manusear a garrafa para encher o copo – e foi aí que lembrou da merda do dispenser. Pressionou o copo contra a alavanca e o encheu de água gelada.

Quando dava os primeiros goles, Fátima entrou na cozinha. Olhou para o marido e limitou-se a comentar: “eu não disse que precisávamos dessa geladeira”. Josias passou o resto do dia descendo bordoada na mulher, com o toquinho mesmo.

Mande sua sugestão para o novo tema do “Desafio do Literato”. Mande um objeto, móvel, figura, qualquer coisa o mais detalhadamente e com mais descrição quanto possível e leia o próximo conto. Sugestões para lipsworld@hotmail.com

Trabalho como editor em uma publicação online. Sisuda, séria, de caráter econômico, acreditem ou não. Em maio passado completei oficialmente dois anos no posto – sim, tem louco para tudo, mas como não sou eu quem paga meu próprio salário, não entrarei no mérito.

O fato é que, ao longo desse período, pude constatar que as mulheres realmente trabalham melhor que os homens, em linhas gerais. Não me condenem. Meu melhor repórter eu indiquei para um emprego melhor, outro saiu da agência por outra oportunidade, embora eu esteja certo de que as razões eram pessoais, e o terceiro… bem, o terceiro é um caso à parte.

Derrubei a primeira das lendas a respeito de cargos de chefia nos últimos meses: a demissão. É difícil demitir, dizem. Não, não é. Bom, não posso deixar de dizer que eu aguardava a oportunidade de tal demissão com olhos muxoxos de uma criança na véspera de Natal, mas diriam os sábios que eu não teria uma noite muito tranquila. Dormi como um bebê. Poucas semanas depois, por ordens superiores, tive de me desfazer de outro funcionário, o qual eu preferia que ficasse. Foi igualmente fácil.

O fato é que, vai um volta um, disponho hoje de uma equipe de três repórteres mulheres – mais rápida, francamente mais determinada e certamente mais obediente. Não, nã contratei ninguém pois queria molhar o biscoito. E não, também não foi por indicação de algum amigo que quisesse molhar o biscoito.

Por enquanto corre tudo às mil maravilhas. Produtividade em alta e exatidão no trabalho. Tudo deve correr muito bem, até uma delas resolver começar a vender produtos da Avon. Sabemos… as mulheres estão roubando os empregos e postos dentro das empresas, mas qual delas resiste a um batom em promoção?

Não muito tempo atrás, quem fosse para os lados da Represa do Guarapiranga encontrava dezenas de vendedores de rua, com pilha de cadeiras, mesas, criados-mudos e toda sorte de móveis de palha, sisal e similares. Os preços eram ridículos e ainda por cima regateáveis.

Um belo dia algum arquiteto decidiu, após encher a cara de vodka e dar uma trepada, que esses móveis, doravante chamados “rústicos”, estavam na moda. Pronto – aqueles móveis antes vendidos a preço de banana em faróis e geralmente levados pela enchente sem qualquer pesar, custavam agora os olhos cara.

Com a chegada da nova novela da Globo onde empurram atores como Lima Duarte como sendo indianos, a merda estava decretada. Peças de palha e junco antes vendidas por R$ 50 agora custam de R$ 1.000 para cima. Como se a maioria dos indianos – que cheira curry, idolatra vacas e considera comer com a mão educação – estivesse preocupada em ter móveis de junco ou ratan.

O fato é que, agora que estou decorando minha casa, e infelizmente sempre gostei de móveis do gênero, terei de esperar o próximo porre do mesmo arquiteto ou então a Globo lançar alguma novela onde o Lima Duarte e o Tony Ramos não sejam mais indianos, mas algum outro povo qualquer que não tenha a palha como matéria-prima para produção de ornamentos. Com sorte, inventam alguma coisa na Rússia e teremos o Lima Duarte no papel de Gorbatchev – com mancha na testa e sem os meus “móveis rústicos”.

João era alérgico a arruda. Não é muito comum, eu sei, mas o fato é que o fulano desembestava a espirrar toda vez que sentia o mais discreto sinal do cheiro da erva. A vida foi passando e João conheceu uma menina, Vânia, com a qual acabou casando.

Não demorou muito até que o casamento começasse a dar merda. Vânia era bastante supersticiosa – e a sogra de João ainda mais. O fato que as duas benziam tudo quanto era coisa que havia na casa, com um maldito ramo de arruda. Carro, sofá, máquina de lavar e até talheres – tudo trazia o maldito cheiro de arruda.

Em pouco mais de três meses morando com Vânia, João só fazia espirrar. Para não desagradar a menina, a qual amava muito, fingia ser resfriado, rinite ou qualquer outra coisa.

Assim, resolveu recorrer a ajuda “profissional”. Alguns colegas do trabalho haviam falado de uma tenda cigana, que agora estava lá pelas bandas do Largo do Payssandu. Diziam que a velhota era realmente milagreira e que resolvia qualquer problema, principalmente de cunho conjugal.

João engoliu seus preconceitos e, um dia após o almoço, foi ter com a velha.

A senhora ouviu calma e atenciosamente a narrativa do pobre rapaz, apens meneando a cabeça de quando em quando. João terminou e a velha pegou um pedaço de papel – chá de barba de bode, alfazema e algun fios de cabelo da mulher. Depois era só tacar pimenta e deixar ferver um pouco, largando o líquido quente numa vasilha aberta sobre a pia.

O negócio realmente “funcionou” rápido. Em três dias, descobriu-se uma antiga dívida de sua família e João teve de vender a casa para quitá-la. Vânia ficou puta e acabou indo morar de novo com a mãe. O sofá, pegou fogo; a lavadora, quebrou; o carro tomou uma porrada enquanto estacionado e acabou levando perda total.

Irritadíssimo, João voltou na cigana. Reclamou horas, mas novamente, a velhota só fazia ouvir. Quando terminou a narrativa, João implorou para a velhota – ela tinha que dar uma receita para que ele recuperasse tudo o que fora perdido.

A velha, dessa vez, nem pegou papel. Foi até uma prateleira, puxou um saco e estendeu para João. “O que raios é isso?”. A velha, placidamente, respondeu: “arruda, você precisa se benzer meu rapaz”. João só conseguiu ser contido após imobilizado e algemado por cinco policiais.

Desde criança, Osmar era um baita jogador de xadrez. Enquanto a molecada se divertia no futebol, taco e andando de bicicleta, Osmar rapelava a velharada na praça do bairro onde morava. Era um prodígio. Na escola, claro que se deu muito bem em matemática. Acabou se formando na área e, como não queria dar aulas, começou a ganhar a vida vencendo torneios de xadrez.

Ganhava uma boa grana… mas nada de especial. Morava num bairro bacana… mas nada de especial. E pegava uma mulher ou outra… mas nada de especial. Tímido, retraído e sem jeito com o sexo oposto, Osmar só se envolvia com intelectuais. E para quem pensa que ser nerd é ter pau pequeno, Osmar tinha um cacete de 24 cm. Muitas das mulheres com quem se envolvia acabavam pulando fora por dois motivos: Osmar só falava em xadrez; e tinha um pau de cavalo, além de foder como um. Sempre assim; se preparava, montava, dava umas cavalgadas e gozava. A merda é que além de pintudo o filho da puta era sem jeito e a mulherada saída da foda doída que era uma beleza.

Mas um belo dia, Osmar esbarrou com Vanessa. Saíram algumas vezes e, embora a garota gostasse de uma tromba, não esperava que fosse daquele tamanho. Contudo, os dois pareciam ter sido feitos um para o outro. Osmar tinha uma piça enorme, mas Vanessa aguentava firme, sem reclamar. Contudo, sempre o avisava: “Osmar, no cu jamais”.

O tempo foi passando. Um belo dia, enquanto transavam no quarto de Osmar, o rapaz assistia, aficcionado que era, a uma partida do mestre Kasparov. Com metade da atenção na foda e metade na TV, Osmar mal percebera que Vanessa estava quase chegando a um orgasmo.

Atônito e hipnotizado pelos lances da partida, Osmar começou a torcer, em voz alta. “Joga o bispo, o bispo, na casa 3”; “não avança, empurra na lateral”; “não faça isso com o cavalo”, e por aí foi. Vanessa, que como eu já dizia, estava quase tendo um orgasmo, começou a se irritar – ela gozando sem parar e o mané colado na TV, narrando partida de xadrez.

Osmar percebeu a inquietude da menina, mas seguiu fazendo observações sobre os lances, tentando prestar mais atenção em Vanessa, de quando e quando. A garota já estava perto de seu limite, quando Osmar lançou a pergunta, com um olho na TV e outro na menina: “e a torre?”

Vanessa não se aguentou e gritou de maneira estridente – “ENFIA NO CU!!!”. Os dois passaram a noite no pronto-socorro, antes de parar de se ver.